segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Pneus abiscoitados no uso urbano, um contrassenso

Pneu com biscoitos grandes e separados, próprio para uso esportivo na terra, é uma opção normal e aceita por quem pedala na cidade, mas isto está mudando. Dependendo do desenho da banda de rodagem e dos biscoitos não faz nenhum sentido pedalar com eles no meio urbano. Aliás, a bem da verdade se não for em competições muito específicas não vale a pena seu uso na nem na terra. 
Não sei de onde o povo tirou que usar pneu com biscoito no meio urbano é mais seguro, dá mais aderência, mas chuto que tenha a ver com corridas de automóvel, da F1, Fórmula 1, uma paixão nacional. De fato, a 300 km\h e na busca do menor tempo possível faz toda diferença usar pneu liso no seco ou com biscoitos no molhado, mas pedalando uma bicicleta a 25 km\h não faz. No meio urbano, com piso firme, regular, e até em estrada de terra batida, pedalar com biscoitos grandes e separados não faz sentido. Dependendo da qualidade da borracha e do desenho da banda de rodagem, que é o que realmente importa, biscoitos podem até diminuir a aderência e a segurança do ciclista. 

Quanto mais suave roda o pneu, mais fácil roda a bicicleta e menor o esforço do ciclista, portanto maior a segurança. O ideal para pedalar no asfalto e até na terra batida é um desenho quase liso, com pequenos sulcos para escoamento da água e sujeira, como areia, e que o centro da banda de rodagem seja contínuo. Repito: biscoitos grandes e separados para ciclista amador é ruim em todos sentidos. Mais, os ciclistas do mountain bike profissional estão usado uns pequenos biscoitos que fazem pouca diferença no rodar da bicicleta.

A história dos pneus foi regrada pelo uso urbano até o surgimento do mountain bike nos Estados Unidos no meio da década de 80. O MTB (mountain bike) cresceu muito por causa das competições e seus heróis, o que levou uma massa de iniciantes a ir para a terra se divertir. Virou chique ter uma MTB com perfil de terra, ou seja, ter pneus cheios de biscoitos. Mais um menos a mesma coisa que ter uma SUV, ótima para o campo, mas que nunca sai da cidade, um contrassenso.
A Specialized começou e teve sucesso como fabricante de pneus e quando foi para o MTB logo introduziu no mercado o Ground Control em 1989, um pneu abiscoitado, excelente, um dos melhores que experimentei, o que levou o mercado todo a uma concorrência pesada. Specialized saiu ganhando os primeiros campeonatos de MTB, o que fortaleceu mais ainda seus produtos, incluindo seus ótimos pneus. Cada fabricante tinha seu próprio pneu, suas próprias verdades, praticamente todas voltadas para uma prática de MTB esportivo, num marketing de MTB profissional, até nos produtos mais básicos. OK, as bicicletas básicas vinham com pneus com desenho mais urbano, mas com um sonho de MTB daqueles cheios de aventura, terra, barro, derrapagens, descidas perigosas...
E surge o mítico campeão John Tomac, muito forte, de técnica refinada, que gosta de usar um pneu muito abiscoitado. Logo será colocado no mercado um modelo com sua assinatura, o Farmer John. Não foi sucesso de vendas, mas por força de concorrência influenciou vários fabricantes, incluindo a Levorin brasileira que inicia  a fabricação de uma cópia (?) que vira o carro chefe de praticamente todas as bicicletas básicas e baratas fabricadas no Brasil. Era um pneu pesado, todo abiscoitado, de baixa pressão, 36 libras, que rodava mal, deformava e furava com certa facilidade, mesmo assim, provavelmente pelo preço, vendeu como água até pouco tempo.

Voltando à história dos pneus MTB, em 1991 a Specialised lança a RockHopper Comp primeira MTB para iniciantes do esporte com 24 marchas (Suntour) e pneus direcionais, ou seja, com desenhos diferentes na frente e atrás. O da frente com biscoitos mais próximos um do outro direcionados no sentido do rodar maior aderência nas curvas, e o de trás com biscoitos maiores e mais separados para melhor tração e frenagem na terra ou barro. Funcionavam maravilhosamente na terra, no asfalto só o da frente fazia algum sentido. A partir daí o mercado vai se transformar, as bicicletas MTB para iniciantes se sofisticam e os pneus vão ficar mais inteligentes, vão rodar mais fácil, vão ser menos motocross.
Surgem os pneus ditos mistos, com o centro da banda de rodagem contínuo para um rodar mais macio, agradável e rápido em terrenos firmes, incluindo terra. A diferença no pedalar para um abiscoitado é grande. 
Hoje a configuração direcional só é usada em competições profissionais, mas com um desenho da banda de rodagem menos agressivo do que no passado, e mesmo estes pneus têm biscoitos menores para melhorar o rendimento do ciclista.

Me ocorreu escrever esta pequena história, que talvez tenha incorreções, mas serve como referência, porque neste fim de semana pedalei no asfalto com um pneu semi profissional muito abiscoitado, típico dos velhos tempos, e fiquei espantado como trepida, como é impróprio para uso urbano, como é ruim no asfalto, e como deve ser lento também na terra. Não teria sido minha opção sequer em competições de MTB, sempre preferi pneus mais rápidos. E porque quando me lembro dos Levorin estilo Farmer John sinto arrepios.

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