Começo aqui fazendo um complemento da carta para o Fórum dos Leitores do O Estado de São Paulo que é dirigido a quem quer ver uma cidade mais ciclável e ambientalmente correta.
No final desta publico a carta enviada.
Aqui quero completar ou complementar o que escrevi e não cabia para o Fórum do Estadão. Como sempre quero ser chato, o advogado do diabo, como dizem. Não acredito em "é isto e ponto", e cada dia estou mais feliz com esta minha forma de pensar. Mesmo o que "é isto e ponto (sem dúvidas, final)" merece ser questionado.
Começo por duas perguntas que não querem calar: Bicicleta não polui? Bicicleta elétrica é solução de mobilidade ou ambiental? É, mas quanto?
Bicicleta polui?
Polui, não se pode negar.
O alumínio sai daqui, Brasil, e vai de navio para a China. Lá é trabalhado, se transforma numa bicicleta e volta para ser vendida aqui, no Brasil. Esta bicicleta não nasceu poluindo, e muito?
Se fosse fabricada no Brasil não poluiria? Não poluiria caso tivesse alta qualidade. A qualidade que temos em boa parte de nossa indústria, não só do setor das bicicletas, é baixo e poluidor, quando não altamente poluidor. Um produto que quebra de cara é muito poluidor.
Com relação ao problema de poluição causado pelas bicicletas, se quiser saber o quanto é, basta ir até qualquer bicicletaria que atende baixa renda e perguntar sobre durabilidade. Olhe na lixeira. Isto para começar. Ou vá a bicicletarias de alta renda, com bicicletas caras, e pergunte qual a frequência de que os donos fazem manutenção nas bicicletas e se todas são realmente necessárias.
Saia pela cidade e pergunte nas bicicletarias quem tem controle e coleta de produtos e gases poluentes, e como é feito o descarte dos recicláveis?
Bicicleta polui menos que um carro ou moto? Com certeza. A questão é como fazer que diminuam a sua própria poluição. Alguém tem números?
Em relação às motos a diferença é muito grande porque as emissões de gases de uma moto, mesmo em comparação com automóvel, é grande. E moto velha e com baixa manutenção é que não falta. Moto realmente é um problema ambiental bem conhecido.
Mas... agora temos as bicicletas elétricas.
Qual é o progama de controle de descarte de baterias e pilhas neste Brasil?
Quanto dura em média a bateria de uma bicicleta?
Quanto custa refazer a bateria? Qual é o custo ambiental comparativo com outras formas de energia?
Outro ponto: eu venho me perguntando quanto o aumento do uso das bicicletas elétricas e similares vai desestimular o uso de bicicletas arroz e feijão? Não estou falando da troca das de propulsão humana pelas elétricas, mas da forma que as elétricas vem sendo usadas em ciclofaixas e ciclovias e que estão assustando os ciclistas normais. Aliás, muitas sequer são "bicicletas", mas um sei lá o que que mais parece com uma minhatura de moto.
Quando se fala em "bicicleta não polui" no geral se está pensando em bicicleta a propulsão humana, não elétrica.
Claro que bicicleta é uma ótima saída, mas quando bem pensada. Não é porque algo é bom ou ótimo que resolve automaticamente todos problemas.
Fórum dos Leitores
O Estado de São Paulo
"O desafio do ambientalismo responsável" publicado no Opinião do Estadão deveria ser matéria de capa. Somos a sociedade dos exageros, em todos sentidos. Quanto mais melhor, e desta verdade não escapamos sequer quando o assunto é sério e nos afeta profundamente. Tenho 70 anos, o que me fez ver uma transformação ambiental que, sem exageros, se pode dizer assustadora - para pior. Mas bem antes da minha terceira idade (?), e por causa da sua consequente maturidade (?), caiu a ficha que para resolver de verdade um problema se deve buscar olhar para tudo que é correlato, e tentar avaliar causas e consequências. Fazer no impulso ou com miopia não raro não resolve como agrava a situação. Trabalhei uns 30 anos com segurança no trânsito para ciclistas, ou como prefiro dizer, a transformação do meio ambiente, leia-se cidade e cidadãos, para o bem de todos, sem excessão, através da implementação do uso racional e sensato dos modos ativos de transporte, incluindo a bicicleta. Modos ativos eram então chamados de "não motorizados", o que incluia pedestres, o que diz muito sobre aqueles tempos. Misturar segurança de ciclistas com "quantos km a mais, melhor" incorre em vários erros, inclusive na segurança do próprio ciclista, mas não vamos entrar aí. É necessário ter consciência de pelo menos as variáveis momento / viabilidade / custo / benefício. Muito além do politicamente correto "um carro a menos", como é o discurso corrente entre ciclistas. O ideal é ter muito muito menos veículos particulares circulando, ninguém nega, mas como, de que forma? Eis a questão. O que se discute há tempo é raso, cheio de propostas mágicas, inconsistentes da forma como são apresentadas. É óbvio um monte de coisa que se fala, a princípio e sem uma análise mais apurada. O que em toda a questão de transformação ambiental urgente não foi nada óbvia foi o como fazer com inteligência, sabedoria e sensatez. O "engulam por que é legal" definitivamente não é legal, mais, é sabidamente improdutivo. Passamos da hora de ouvir, entender, conversar e acertar, em tudo, não só na urgente causa ambiental. O buraco é muito mais embaixo, o que dá medo, o que leva a acreditar em contos da carochinha.
Parabéns pelo sensato texto publicado. A única crítica é que, um texto como este, pela sua importância, deveria ser aberto a todos, não só assinantes.
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