quinta-feira, 22 de julho de 2021

Roda, guarfo, quadro e a diferença da bicicleta estar perfeitamente centrada

A primeira experiência que tive com rodas perfeitamente "zeradas", ou seja, perfeitamente centradas, foi inesquecível. Entreguei uma bicicleta para Dani Aliperti e recebi a mesma completamente diferente, muito mais solta, muito mais fácil de pedalar, um prazer difícil de explicar, quase uma outra bicicleta. Da água para o bom vinho. 
Uns dias depois pedi para Dani que gostaria de acompanhar o trabalho dele centrando uma roda e quase caí de costas com as minúcias e a precisão. Mestre é mestre. A maioria dos bons mecânicos não seria tão cuidadoso, não gastaria tanto tempo e pararia a centragem da roda quando as diferenças estivessem um pouco abaixo de 1 mm. Dani parou quando o aro estava realmente zerado; perfeito! Quase cheguei lá, mas com muito esforço e paciência. Faz uma enorme diferença no pedalar.

Recentemente tive uma experiência interessante com garfo desalinhado, destes que são vendidos para reposição. Com as mãos no guidão era quase imperceptível, mas com guidão solto a bicicleta tendia suavemente para a direita. Neurótico e perfeccionista que sou coloquei mãos a obra e depois de muito trabalho consegui zerar o garfo, ou seja, deixar o garfo completamente centrado. A bicicleta não tende mais para os lados e a melhora no rodar da bicicleta é muito sensível, para mim impressionante.

Como explicar? Pela física. Quanto menos vetores de força houver mais fácil fica movimentar o objeto. 

É deprimente que a maioria dos garfos básicos novos de reposição vendidos venham desalinhados, sejam garfos rígidos ou com suspensão. Como a maioria dos ciclistas não consegue perceber a diferença porque nunca solta a mão do guidão as reclamações são poucas, quase nenhuma, e fabricantes e distribuidores continuam lucrando felizes. 
Já que falei sobre roda alinhada, também é deprimente que seja tão comum comprar aro novo que não vem perfeitamente redondo. A emenda, opa! a emenda...
E tem muita bicicleta que é vendida com quadro desalinhado. 
Puts! que deprê! Não, não para por aí. O pior de tudo, 'inda mais deprê, deprê para valê! é que todos vem com o "selo de qualidade de IMETRO, sua garantia de qualidade". Vai nessa!

segunda-feira, 19 de julho de 2021

Proteger a indústria nacional de bicicletas?


Bicicleta é veículo de duas rodas, portanto a segurança de seu condutor (o ciclista) depende de um funcionamento perfeito, sem qualquer falha; ponto final. A lei obriga. Qualquer variação deste princípio pode resultar ou resulta em acidente; fato inegável.

Qualidade nasce na indústria. Pau que nasce torto segue torto.

Corre no Congresso uma proposta de projeto que cria barreiras para a importação de forma a proteger a indústria nacional. A lei é específica para alguns setores, mas sempre aparecem os nossos famosos "jabotis" que ampliam a lei e aí está o perigo. 
No que diz respeito ao setor da bicicleta brasileira, pelo que significou para os ciclistas no passado, considero um erro monumental qualquer proteção ao setor. Sou absolutamente contra.
 
Bicicleta hoje tem alto padrão de qualidade porque governos sérios entendem que para estimular o seu uso não pode ser de outra forma. Segue o princípio da vidraça quebrada: quando você tem uma vidraça quebrada é praticamente certo que as outras também serão quebradas. Quando todas as vidraças estão inteiras e limpas a possibilidade de problemas praticamente zera. 
Fabricar bicicletas mesmo pequenos com defeitos ou algum mal funcionamento é começar mal, azedar tudo que vem depois, principalmente o estímulo ao pedalar. Mais ciclistas inseguros com a qualidade, menos ciclistas nas ruas. País sério sabe que estimular mobilidades ativas é crucial para construir um futuro sustentável.
O setor da bicicleta no Brasil é cheio de problemas e distorções e muitas destes vem da qualidade industrial. Diga-se de passagem que não é exclusividade do setor de bicicletas, muito pelo contrário.

Sem corrigir os inúmeros entraves e distorções que o setor industrial brasileiro tem hoje, sem reeducar o público consumidor, sem ter um plano de curto, médio e longo prazo que englobe tudo que é relacionado à produção, distribuição e durabilidade de bens, uma lei de proteção ao setor industrial brasileiro será não um tiro no pé, mas a amputação das duas pernas com direito a uma imensa fábrica de marmeladas que beneficiará uma minoria, o que já cansou, não é?. 

Desde 1982, quando fiz o primeiro projeto de estímulo para o uso de bicicletas, venho batendo na tecla que ter um setor industrial da bicicleta de qualidade, ou seja, forte, é crucial para que o ciclista chegue onde quer: pedalar com liberdade e segurança. Da forma como estamos temos ilhas da fantasia para umas poucas minorias. Não ter priorizado a qualidade foi um crime com o consumidor, o ciclista, a bicicleta, e a qualidade de vida das cidades. Não priorizar qualidade é uma sacanagem sem tamanho com as populações de baixa renda. 

O Brasil é uma baderna burocrática, legal e fiscal e acredito que muitos dos que tem problemas hoje produziriam corretamente caso o ambiente fosse minimamente civilizado e moderno, o que não é, repito.
Não dê o peixe; ensine a pescar, esta é uma verdade que ninguém consegue contradizer.