Buenos Aires X São Paulo, em bicicletas
Arturo,
Boa noite
Obrigada
pela atenção. Pode publicar, porém eu peço que, se possível, deixe apenas o meu
primeiro nome (sem o sobrenome ou o mail).
Desde que
decidi que vou voltar a andar de bicicleta, tenho acompanhado alguns blogs de
cicloativismo e algo que me incomoda é justamente o que você mencionou no
início - neles o motorista é sempre culpado. E isto eu tenho dificuldade em aceitar.
Por opção,
meu primeiro veículo foi motocicleta. Meu segundo, bicicleta. Só fui aprender a
dirigir automóvel aos 33 anos, meio contra vontade, por causa de minha
mãe (na época idosa e com dificuldade de locomoção). Meu primeiro
susto ao dirigir um automóvel foi descobrir que os pontos cegos, que como
motociclista eu tinha certeza que conhecia, eram ainda maiores do que eu
acreditava, podendo esconder até um carro. Aquele desenho dos pontos
cegos, no manual da auto escola não chega perto da realidade. Passei a tomar
muito mais cuidado ao usar a moto e a bicicleta porque descobri que,
de fato, às vezes o motorista não tem como te enxergar dependendo de
onde você está.
Obrigada
novamente.
-------------------------------------------------------------------
bom dia
Obrigado pela autorização
Eu normalmente não divulgo nomes. Parto do princípio que não é o nome, mas a
ideia, o conceito, o pensar que interessa. Infelizmente nos tornamos numa sociedade
mais personalista do que já éramos.
-------------------------------------------------------------------------------
Mensagem
original
Nome: C
Cidade: São Paulo
Mensagem: Arturo, boa tarde.
Começando com a questão genérica: você viu esta notícia (http://noticias.terra.com.br/mundo/america-latina/buenos-aires-educacao-para-o-transito-pauta-discussoes-sobre-bicicletas,8b4a2febce7de310VgnVCM4000009bcceb0aRCRD.html)
sobre mortes de ciclistas na Argentina? Pontos que me chamaram a atenção na
notícia: a posição do presidente da Associação dos Ciclistas Urbanos de Buenos
Aires, as respostas da pesquisa feita entre os ciclistas sobre comportamento
deles no trânsito e, principalmente, as questões levantadas pelo presidente da
Associação Luchemos Por La Vida. Como você conhece tanto Buenos Aires como São
Paulo, poderia comentar a notícia?
----------------------------------------------------------------------
bom dia
Por partes.
Tenho dito
que o maior problema do ciclista no trânsito é o próprio ciclista. Aqui em São
Paulo já perdi a paciência com os formadores de opinião que só reclamam, só
responsabilizam os motoristas e o trânsito pelos seus problemas. Tenho repetido
para eles: “Aprende a pedalar”.
Em
qualquer lugar do mundo, em qualquer trânsito, com qualquer veículo, inclusive
a bicicleta, se você souber conduzir a maquina a possibilidade de se acidentar
diminui muito, mas muito mesmo. Normalmente quem sabe pedalar de verdade não
reclama do trânsito. É lógico que tem lá seus conflitos, seus incidentes, que
passam sem drama, sem agressão, sem cair num nível de tensão inaceitável para a
segurança.
Pedalar
de verdade definitivamente não é só subir na bicicleta e seguir em frente. Não
é necessário ser ciclista profissional; basta ser honesto consigo.
Infelizmente
os órgãos de trânsito de todas as
partes não orientam ou educam corretamente os ciclistas. As razões vão do
desconhecimento do que é pedalar à formação destes voltada para a fluidez de
trânsito motorizado, fortemente enraizada no meio técnico e político. Ter pelo
menos uma pessoa que realmente saiba o que é bicicleta, como NY tem, faz uma
enorme diferença para os ciclistas. Querer impor regras e leis que estão no
Código de Transito, que são muito voltadas para veículos motorizados e
restrição de pedestres e ciclistas, é uma burrice improdutiva que não tem
tamanho. São Paulo peca neste ponto. Não sei como será em Buenos Aires.
Argentina
tem uma longa tradição automobilística, muito reforçada até pela memória viva
dos feitos do grande Fangio. Argentina vive no passado glorioso. Eles socam o
pé no acelerador para valer. Tem uma consciência baixa sobre a importância de
limite de velocidade. Confesso que não sei o tamanho do problema com os
pedestres, mas na época que ia para lá com frequência nunca vi ou ouvi falar
sobre um atropelamento, talvez por sorte. Ou talvez por que é raro ver alguém
furando o sinal vermelho, coisa comum por aqui. Porrada entre carros, algumas
violentíssimas, aos montes.
Buenos
Aires é uma cidade muito particular em vários aspectos. Uma delas é que é
a Capital Federal da Argentina, mas não é a Argentina, o que de vez em quando
os porteños fazem crer. Aliás, tem muito argentino que se pudesse colocaria
fogo em BsAs com todos porteños dentro, mas isto é uma outra história.
Escrevo
isto por que os números de mortos apresentados são da Argentina e não só de
BsAs. Precisaria saber como se dão estas mortes. Mais que isto; é de crucial
importância saber o número e perfil de acidentes não fatais para entender o que
realmente acontece.
Já os
números percentuais referentes ao comportamento no trânsito devem ser parecidos
com o que acontece aqui. Lembro a você que a bicicleta em BsAs é um fato muito
recente, estourou a dois anos, e que sempre neste começo a situação é muito
confusa. Depois se acomoda. O fato é que a prefeitura de lá se mexeu e colocou
uma estrutura que não teremos em São Paulo ainda por muito tempo.
Saindo
um pouco do óbvio: há um inconsciente coletivo, um caráter social, que deve ser
incluído nesta história. Começa pelo ‘fangio’ deles de cada dia e termina na
contaminação do exemplo que vem de cima, este sim péssimo. Não dá para separar
violência do exemplo dado por governantes, principalmente os mandantes máximos.
No caso da Argentina, a presidente é o que há de pior possível. A política
populista que eles vivem contamina tudo, principalmente princípios sociais. Os
reflexos são imediatos nos números de mortes violentas, seja por assassinatos
ou no trânsito. Quando o discurso é “viva o coitadinho”, típico de populistas,
grupos sociais considerados desprotegidos ou marginais, como ciclistas, acabam
negando valores de boa convivência e buscando formas de sobrevivência social
nos termos de eu, desprotegido, contra ‘eles’... Acontece em todas partes do
mundo, mas provavelmente deve ser mais dramático (esta é a palavra) na
Argentina. “Gardel canta cada dia melhor!”
Segurança no
trânsito requer autoridade com legitimidade, sem exceção. E populismo é tudo
menos autoridade. O resultado se vê lá e cá.
No
final da matéria que mandou tem a seguinte pérola: O código de trânsito da cidade de São Paulo
prevê punição aos ciclistas que não tenham os equipamentos obrigatórios, além
de multa e perda de 4 pontos na carteira do motorista para quem ultrapassar a
distância de 1,5 metro ao passar ou ultrapassar uma bicicleta.
Esta linda
pérola aponta para um jornalismo mal informado, pelo menos no que diz respeito
a São Paulo. A lei é federal e não é exatamente assim.
É
muito provável que BsAs resolva esta questão muito antes de São Paulo, até por
que o porteño ama sua cidade, a respeita, se sente parte dela, quer vê-la bem.
Eu não digo o mesmo do paulistano
Posso
publicar nossa conversa no Escola de Bicicleta Correio Blogspot?
Arturo Alcorta
Escola de Bicicleta
www.escoladebicicleta.com.br
-----------------------------------------------------------------
Veja que impressionante o crescimento do uso da bicicleta em Buenos Aires
http://www.lanacion.com.ar/1585626-crece-el-uso-de-la-bicicleta-como-medio-de-transporte
Nenhum comentário:
Postar um comentário