terça-feira, 23 de setembro de 2025

Ciclovias que não escoam a água e ciclofaixas que viram rios

Será que chove em São Paulo? O sistema cicloviário que foi implantado levou em consideração chuvas? A pergunta parece ironica, mas pelo que se vê pedalando na chuva ou depois dela não é, não é mesmo. 

Ontem sai quando deu uma estiada. Não precisei de capa, mas tive que ir muito devagar porque a drenagem das ciclovias é péssima. Na chuva ou depois dela só de barco a remo. Ridículo! Na Europa o pessoal sai de bicicleta em qualquer condição. As ciclovias, ciclofaixas ou qualquer lugar por onde passe a bicicleta são preparados para escoar ou absorver a água com rapidez. A curvatura do piso faz escoar a água e o tipo de asfalto usado, sim asfalto, em certos casos absorve a água quase tão rapidamente quanto arreia. Temos este tipo de asfalto aqui, já é usado em ruas e avenidas de São Paulo, e em várias estradas. Dá para fazer com absorva mais rápido ainda, "basta ajustar a usina de asfalto" disse um renomado especialista em pisos rodoviários da USP.

Boa parte das ciclovias paulistanas enchem de poças de água que não escoam nem bom tempo depois da chuva. A formação de poças de água é fácil de evitar, aliás, obrigatoriamente deve ser evitada com uma curvatura ou inclinação correta do piso. Os responsáveis pelas ciclovias que temos não estudaram, nem conhecem, esta ciência. No caso de ciclofaixas, muitas simplesmente viram rios com as chuvas. Enfim, ridículo.

E em muitas delas usaram uma tinta que é impermeável. Pelo menos pararam de usar a tinta que mandava para o chão até ciclistas profissionais. 

Fico profundamente irritado em dias de chuva porque para circular nas ciclovias não tenho bote e não sou bom remandor.

Num momento de estiágem tive que pedalar na ciclovia da Pedroso de Moraes. Tem trecho que é uma poça atrás da outra, ridículo, irritante. A chuva tinha parada já fazia um bom tempo, portanto o piso deveria estar seco. Já reclamei para as "otoridade", mas nicas de resposta e muito menos ação. 

Pedalei com chuva em várias cidades da Europa, e sei que não precisa ser assim por aqui. Pedalar na chuva pode ser chato pelo lado do molhado, mas passar por todo trânsito completamente atravancado compensa. Num destes dias de chuva forte um conhecido estava de carro e demorou 2h30m para chegar em casa num trajeto que eu fiz em um pouco mais de 30 minutos no mesmo dia e hora. Simples assim. Quem usa carro sabe bem.

Pedalar na chuva e vento

Hoje não dá. Não dá o que? Sair para pedalar. Uai, por que? Chuva e vento em rajadas fortes. OK, até dá, mas a possilidade de chegar empapado é grande. Por que? 

Não tenho problema algum em sair de bicicleta com chuva, mas tem um limite de quanto está chovendo ou a capa, por melhor que seja, não vai segurar. Outro problema é vento. Com vento normal ainda dá para ir, mas se o vento for forte, em rajadas e lateral a capa voa, abre, entra água por tudo quanto é canto. Aí só vou se for inevitável. Falo como ciclista urbano e não como esportista. Os equipamentos de chuva são bem diferentes. O esportivo é fechado, calça e jaqueta, o de ciclista urbano deve ser aberto para evitar suor.  
 
Com lufadas de vento fortes, intermitentes e picos de tempestade, como está acontecendo neste instante, daí não dá. Não há equipamento que segure. Tá bem, pode até ter, e deve ter, tem o que segure, mas para outro uso que não o pedalar. Pedalar com um equipamento que sele você seco vai ocorrer um outro problema: o suor vai ficar dentro da capa, macacão, ou qualquer roupa a completa prova de chuva ou molhado. Ouça o que digo, é pior que ficar molhado de chuva. Nestes casos, em vez de você ficar molhado em alguns lugares do corpo, você ficará encharcado em todo corpo. E depois que você chegar ao destino vai demorar muito mais para ficar seco. Falo de experiência própria. Antes de conhecer a capa correta para ciclistas, o poncho, exprimentei de tudo, inclusive equipamento para marinheiros, e não dá, é muito ruim por várias razões. 
Equipamento de chuva para ciclista tem que evitar que a água da chuva chegue ao corpo e permitir que a transpiração do corpo saia.

Tem uma nissei que pedala, faça sol ou chuva, com um guarda-sol preso à bicicleta. Numa chuva bem fraquinha pelo menos pode deixar a cabeça seca. Capa plástica transparente vendida nas esquinas e campos de futebol também não serve porque seu corte é para pessoas que estão em pé ou a pé, caminhando, e eventualmente sentadas. O ciclista senta na bicicleta, mas movimenta as pernas. Mais, a abertura destas capas é frontal por botões, o que com a velocidade da bicicleta não funciona direito. Finalmente, o material é muito frágil, vai para o lixo rapidinho. 

Qual a capa ideal para ciclistas? A que tem o mesmo desenho dos ponchos de quem monta a cavalo. Cobre todo o corpo, inclusive braços e mãos, deixa as pernas livres para pedalar, e ventila por baixo, o que evita que o suor fique retido junto ao corpo. Há diversos graus de impermeabilização, para país tropical como o nosso recomendo o mais alto. Também há tamanhos e cortes diferentes, alguns inclusive para proteger a mochila. Encomendei uma para Ana, que é pequena, e veio uma que é grande para mim, que tenho 1,83 m. Eu tenho algumas, uma para cada mochila, e sei que há uma diferença no peso. Vestido não faz diferença, mas para quem leva sempre na mochila faz.

Descubra se a capa - poncho vem com refletores, o que em dia de chuva faz uma enorme diferença na segurança do ciclista. Lembre-se que com chuva a visão dos motoristas diminui.



quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Mais km de ciclovias dá no que?

Quando trabalhei com os holandeses do I-ce, os alemães do GTZ, e os americanos do IDTP, cansei de ver apresentações com dados sobre implantação de sistemas cicloviários e crescimento do uso da bicicleta. O curva / número de ciclistas não estar crescendo numa proporção relativa ao crecimentos de kms de ciclovias e ciclofaixas implantadas, pelo menos aqui, em São Paulo, não me espanta.

Em todas cidades europeias e americanas onde foi introduzida a bicicleta com resultados positivos todo o processo não se resumeu a implantação de vias exclusivas para ciclistas. É sobre a cidade, como sempre repito. Deu certo porque pelo menos foi feita uma mexida geral no urbanismo, todas mobilidades, no treianmento e na educação. Mais, eles tem profundo apreço pelo dinheiro público, o que os faz gastar com sabedoria, evitando implantar kms onde sequer moscas passam. O nosso mais é melhor para estimular não funciona assim.

A mais pura verdade, e deprimente, é que brasileiro no geral não gosta de pesquisas, dados e estatísticas, e por que não dizer o cumprimento das leis. Não somos o país das leis que colam e as que não colam? Pois então. Contando com a desconfiança da população na coisa pública, querer que experiências que deram certo lá fora podem ser repetidas aqui nem sempre se aplica. "Brasil não é para principiantes", não me lembro quem disse, mas acertou na mosca.

"Tá bom do jeito que está", velho e incruado dito popular. "Pelo menos fizeram... "Melhor assim que sem..." e por aí seguimos. Vai dar certo? Duvido.

O que temos até aqui foi conseguido a custo de uma luta chata, cansativa, muitas vezes grosseira, insultuosa. Entrar chutando o pau da barraca dá bons resultados em raríssimas situações. Fez na porrada, fez de qualquer jeito não traz os resultados esperados, nunca. E muito do que foi feito saiu, melhor, começou de forma torta. Daí um "Toma guri, vai brincar ali e vê se para de encher".

Dizer que o número de ciclistas não acompanha a expansão das ciclovias será correto? A partir de que números, que dados, tirados de onde, de que forma? Sei que os dados que temos atualmente são muito mais acurados que tínhamos há 20 anos, mesmo assim duvido que quem levantou estes dados tenha tido verba, equipe e tempo suficiente para saber o realmente está acontecendo. 

Bato uma aposta que a verdade não interessa para muita gente. Manter o emprego, manter a entrada de um dinheirinho, manter as amizades, manter..., manter..., manter... interesses individuais são muito mais importantes que os coletivos. Entre os contra e mesmo entre os a favor. Estou falando besteira? Veja o noticiário sobre a votação do "deixa eu proteger o meu" que acaba de ser aprovada no congresso. Só um lado votou a favor? Não tem nada a ver com esta reportagem, os ciclistas e suas ciclovias. É mesmo?

Fato inequívoco é que a quase totalidade dos usuários de bicicletas, mecânicas ou elétricas, querem que se dane se cresceu, diminuiu, se fizeram correto ou errado. E aí está o problema maior.

Não importa o que esteja acontecendo, passou da hora de aprendermos que a melhor coisa a se fazer, sempre e em tudo, é perguntar-se o que não está bom, o que pode ser melhorado, e principalmente o que não pode ser repetido. Fazer isto sem dedo em riste.









domingo, 7 de setembro de 2025

ciclismo: ensinamentos do budismo e do estoicismo

Para início de conversa, o titulo que cheguei a escrever seria "fé no ciclismo: ensinamentos do budismo e do estoicismo", mas, como sempre, busquei no dicionário o sentido exato de "fé" e...

1 confiança absoluta (em alguém ou em algo); crédito
2 Religião
no catolicismo, a primeira das três virtudes teologais

Não, eu não tenho "fé" na bicicleta, pelo menos no sentido literal, mas gosto, confio, faço votos por ela, sem extremos. Resumindo a ópera: não sou radical, não vejo a bicicleta pela bicicleta para a bicicleta, até porque não existe burrice maior que fanatismo. Fanatismo é destrutivo.

Tendo dito isto, sigo: amor incondicional, fé absoluta, ou qualquer inflexibilidade ou radicalismo fecha as portas para o conhecimento mais amplo.
Pedalar, ou um pouco mais, ser ciclista, demanda conhecer e estar aberto a conhecimentos, que nunca acabam.

Uau! Este que vos escreve pirou total, mas sigamos em frente.

Piração é liberdade, e segundo o budismo, não há liberdade sem disciplina. É aí que quero chegar, porque aí é que está o "ó do borogodó" do aproveitar a bicicleta ou qualquer outra coisa na vida.
Se tiver fôlego e determinação para pedalar montanha acima até chegar ao cume, pergunte ao eremita qual o sentido da vida. Antes de ele roubar tua bicicleta e desembestar montanha abaixo ele responderá solenemente: "não há liberdade sem disciplina", e bem baixinho, já com uma mão no guidão, ele concluirá: "sem alguma piração não há liberdade". E no exato momento em que você admirado com a sabedoria ouvida olhar o céu e suas lindas brancas nuvens e a maravilhosa vista verde de montanhas ao redor que só aquele pico de tem, o eremita silenciosamente terá passado a perna por cima da bicicleta e silenciosamente sumirá ladeira abaixo gritando de alegria "Vai mané!".

Comecei o texto com esta explicação porque, como tudo nesta vida, há um paralelo entre o significado de cada palavra e a razão de cada ação que se faz ao pedalar. O bom pedalar, o pedalar com segurança, o pedalar com prazer, o pedalar sem problemas ou tensões, demanda um mínimo de disciplina. Quanto mais disciplina melhor. Disciplina que constrói liberdades.

-  ciclismo é a arte da suavidade
-  ciclismo é a arte de preservar energia

Não confunda disciplina com ato de fé ou religião. São muito diferentes e levam a resultados bem diferentes, até radicalmente opostos.

Não precisa ajoelhar no milho para pagar os pecados, basta conscientizar algumas verdades sobre o que é o bom pedalar para chegar ao nirvana do ciclismo. A primeira delas é trancar a bicicleta até quando estiver na presença de qualquer sábio eremita que diz conhecer o sentido da vida. Einstein que o diga.


Sem contornos e indo direto nas dicas para pedalar melhor: pedalo direto há quase 50 anos, li muito, ouvi muito, vi muito, convivi muito, e não tenho qualquer dúvida que "suavidade e ou preservar energia" é um b a ba, 1+1=2, cartilha e tabuada juntos e unidos. Ou seja, o básico do básico do básico, amém.

Nos dias de hoje se faz uma confusão perigosa em relação ao que é excesso. O segredo da vida definitivamente não está no excesso, é o que a boa maturidade de uma boa velhice ensina. Experiência de vida. Quanto mais se pedala, mais se aprende.

Há uma diferença enorme entre ser religioso e entender o que está realmente escrito nos livros, qual o sentido além do literal das palavras. Assim como há uma enorme diferença entre o fanático, aquele que se diz fiel, e o que acredita no conhecimento, busca constantemente e o aplica com bom senso, sabedoria e liberdade.

A relação com a bicicleta não tem nada de bitolada, tacanha, mas com vida sadia, corpo, mente e relação com tudo sadia, leve, proveitosa. Liberdade.

O que peço aqui, em nome da segurança e prazer de cada um de vocês, é que procurem aprender, sempre. Bicicleta e pedalar pode e deve ser um caminho para uma vida melhor, não o único, definitivamente não a única forma, mas sem dúvida uma forma comprovadamente eficiente para se amadurecer, ou alcançar a paz e saúde de que todos almejamos.

Nobre caminho óctuplo do budismo (eu diria caminho inteligente):

  • compreensão correta - ou entendimento correto. Do que? De tudo.
  • pensamento correto - pensou besteira, danou-se
  • fala correta - quanto menos blasfêmia - xingamentos - mais segurança
  • ação correta - pedalar com suavidade
  • meio de vida correta - preservar energia para os momentos necessários
  • esforço correto - não desperdiçar
  • consciência correta - esta aqui é difícil (o eremita sabe bem). Conte até 10
  • concentração correta - estabilidade emocional e foco mental

Da filosofia estóica
  • priorizar o conhecimento e agir com a razão
  • atitudes tem mais valor que palavras
  • focar no que deve ser modificado e controlado
  • causa e efeito
  • agir com prudência
  • conviver e aceitar sua vida da forma que ela é
Dos princípios do estoicismo não coloquei todos, só o que entendo que são mais fáceis de serem aplicados por quem pedala.



sexta-feira, 5 de setembro de 2025

O que aprendi por pedalar sem freios: procure uma bambiarra qualquer.

Foi com a primeira bicicleta com freio a disco que tive. Nunca tinha mexido num freio a disco, então peguei o manual, li inteiro, e regulei como manda. Depois de rodar alguns poucos km na cidade, onde funcionou com perfeição, parti para um cicloturismo relativamente curto, algo em torno de 180 km, mas com uma altimetria pesada, qualquer coisa em torno de 3.500 metros. No meio do penúltimo dia, no topo de uma montanha, cheguei praticamente sem freio. Fiz o que pude, o que me lembrava de ter lido no manual e fiquei com um poder de frenagem parecido àqueles freios ferradura em aço. Para quem nunca (felizmente) pedalou com um destes, explico: mesmo devagar você freia com todas as forças um sistema borrachudo que nunca sabe onde e quando vai parar. Descidas? Ou entra devagar,  quase parando, ou a bicicleta vai desembestar sem controle. Então, meu freio a disco ficou assim.

Tomei uma tremenda bronca de meu velho amigo e companheiro de viagem por não ter revisado a bicicleta antes de sair. Expliquei que a bicicleta e os freios (a disco) eram novos, zero km, mas não adiantou.

O último trecho de viagem tive que enfrentar uma daquelas descidas longas, das com placas avisando para usar o freio motor, completamente na banguela, completamente sem freio, uma das mais assustadoras situações que vivi como ciclista. Detalhe, o trecho estava em obras e tive que ir para a esquerda e descer na pista dos carros que vinham a 100 km/h.

Em Jacarei entrei numa bicicleta muito simples, pedi para consertarem, a dona disse que não tinha aquelas pastilhas, mas para minha sorte saiu da oficina um garoto que ouviu a história, olhou, avisou que as minhas pastilhas tinham acabado e se eu quisesse ele faria uma ganbiarra que me permitiu ir até a rodoviária, e da rodoviária de São Paulo chegar a passo de lesma seguro em casa. 

Já contei esta história aqui, mas tomando banho sei lá porque ela voltou inteira da minha memória. Aliás, sei porque. Gambiarra. 

O problema que tive foi de defeito de fabricação das pastilhas, que acabaram com menos de 180 km. Não, não eram vagabundas, mas de marca respeitada pela qualidade.

O meu erro foi tentar arrumar pensando nos termos do manual de proprietário. Eu deveria ter parado, me acalmado, e inventado alguma solução anormal que funcionasse. Provavelmente se estivesse só faria, mas com meu velho, querido e muito difícil amigo por perto não dava.

Voltando aos malditos freios ferradura de aço acionados em aros de aço cromado. Fazendo um monte de ganbiarra freiava um pouco melhor, digo como exemplo aleatório, em vez de parar a bicicleta em 10 ou mais metros, parava a bicicleta em 7 metros. Comparação: com um freio a disco popular pararia a mesma bicicleta em 2 metros, se tanto. Se um dia tiver a oportunidade, pedale com uma bicicleta da década de 60 ou 70 e vai entender o que escrevo aqui, mas vá devagar. 

Óbvio que os manuais técnicos estão corretos, mas dentro das condições ideias que o fabricante imagina, quer, ou lhe é rentável. Mecânicos trabalham (mais ou menos) nos parâmetros do fabricante por uma razão simples: dar um jeitinho, fazer uma gambiarra, leva tempo e tempo é dinheiro. Eles vivem daquilo.

Agora, você, como eu, no meio do nada, com uma mão na frente outra atrás, vale qualquer coisa. Gambiarra na cabeça!