As trocas de marchas no câmbio traseiro começaram a ficar imprecisas de uma forma que minha experiência sabia que a cabeça do cabo estava esgarçando. Encontrei uma bicicletaria aberta, entrei, pedi para o mecânico trocar o cabo "que está para estourar", o garoto soltou os conduites do quadro, olhou o cabo inteiro e disse que não era o cabo. Pedi para ele abrir a tampa do passador de marchas, ele o fez, e lá estava a cabeça do cabo esgarçada. Ele sorriu um pouco envergonhado.
A troca foi rápida e aí veio o ajuste fino. Como é comum entre os mecânicos de bicicleta, o jovem mecânico passou a girar o pedivela rapidamente trocando as marchas para cima e para baixo, de vez em quando fazendo um ajuste fino no câmbio. Não dava ajuste fino nas marchas mais leves, as coroas grandes. Ele parou, olhou sério para mim e disse que não conseguia ajustar porque "Ou o câmbio está torto ou está desalinhado". Não disse nada, agradeci a troca do cabo, paguei, e sai da bicicletaria do jeito que estava.
Na esquina parei, engatei a correte na antepenúltima marcha, a terceira maior, me ajoelhei atrás do câmbio, girei o parafuso de ajuste do cabo até a polia superior ficar alinhada com os dentes da marcha, exatamente como manda o manual da Shimano. Problema resolvido. Todas as marchas funcionam.
Segui viagem pensando neste história toda. Conheço aquele mecânico e sei que ele tem prática, trabalha numa bicicletaria que cresceu, ficou bacana, tem uma oficina organizada, boas ferramentas, deve ter bastante cliente. Não faço ideia se o que aconteceu foi por falta de conhecimento do Manual Técnico da Shimano, o que é estranho porque todas peças originais vem acompanhado com um, ou se uma espécie de engana bobo. Um leigo vendo o mecânico girar rápido o pedivela enquanto ele troca marchas talvez fique admirado, o que talvez facilite a venda de um câmbio novo, o que de passagem me foi oferecido.
Pensando nesta técnica (técnica?) de ajustar o câmbio traseiro me veio à cabeça que nenhum ciclista gira os pedais e troca a marcha tão rápido e com tão pouca pressão sobre o sistema. Quando se troca a marcha de uma bicicleta a corrente está tensa, sofrendo a força do pedalar, por menor que seja. Girando na mão com a roda solta no ar a corrente trabalha sem forças agindo sobre ela. Não faz sentido esta técnica de ajuste fino do câmbio tão comum entre mecânicos.
Para quem faz mecânica quanto mais rápido e correto o serviço maior é o lucro. Olhar por trás da relação de marchas, girar o parafuso de ajuste do cabo e alinhar a corrente com o dente da marcha é muitíssimo mais rápido e eficiente que ficar girando o pedivela feito um louco. Aliás, repito, o certo é seguir o que a Shimano recomenda em seu manual. Ponto final.
Adoro o som da expressão 'rebiboca da parafuseta'. Virou popular depois de uma propaganda na TV. Por outro lado rebiboca da parafuseta é a forma mais simples, comum e eficaz de pegar trouxa. O que já me tentaram empurrar troca de peça é fora de série. Em vez de empurrar eu tinha escrito "dar golpe", como diz um amigo, e de fato não é empurrar, mas dar golpe, enganar, agir de má fé, verdade seja dita. Não dá para colocar nos termos de "ignorância", porque não é, é inaceitável que seja.
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